Um tombo do pé de manga.
Por que a maioria dos profissionais só enxerga o RP como um comunicador empresarial? Por que até dizem “comunicação organizacional”?
De verdade? Chega de brincar de RP. Agora vamos falar sério.
O contexto socioeconômico do surgimento de uma profissão, é claro, diz muito sobre sua função e a atuação do seu profissional. O fato é que a realidade brasileira foi muito distinta da realidade de efervescência política, econômica e social vivida nos Estados Unidos quando do surgimento das Relações Públicas. Tudo isso, lógico, faz toda a diferença. Aprendi isso com um texto do Júlio Pinho.
Nos Estados Unidos, terra do Tio Sam, a profissão nasce como resultante da organização do movimento sindical e suas ideologias marxistas. Era uma época de intensa mobilização dos grupos sociais, do fortalecimento da opinião pública. E aí, cai do céu a figura do RP. O cara capaz de administrar os conflitos com a opinião pública. Uma briga só para conquistá-la e amansá-la. O RP como um verdadeiro domador.
No Brasil, terra do Carnaval, as RP importadas surgem com um pé na administração pública. A bola da vez era fazer campanha dos órgãos públicos. E Vargas e o DIP sabem bem disso. Era só conceito e imagem, imagem e conceito do governo.
Mas e aí? Aí que nesse pedaço brasileiro do mundo das Relações Públicas é como se tudo se resumisse à comunicação da empresa com o público interno, externo, misto e com a imagem de empresas e pessoas. É essa história de imagem percorrendo as décadas...
E a tal da função política das Relações Públicas? (Boas vindas ao Porto Simões!) Acho que todo mundo matou essa aula. Cadê a proposta de diálogo e consenso entre os interesses conflitantes? E não me venham falar de “conflito” com o RP na empresa ouvindo e atendendo os funcionários! Ou será que todos esquecem que a mesma mão que contratou os funcionários também contratou o RP? É muito difícil entender a qual interesse o RP serve dentro de uma empresa?
Aqui, as RP não vinculadas às práticas democráticas, às questões políticas e sociais, acarretam uma crescente subutilização da profissão. Isso tudo do ponto de vista de uma futura RP angustiada e em crise profissional. No caso, eu!
A gente estuda Antropologia Cultural, Teoria Política, Planejamento Participativo, Realidade socioeconômica e política brasileira, Psicologia, Sociologia (e aprende até da indústria cultural!), Ética, Economia, Filosofia...pra quê? Pra saber como fazer um público comprar um produto? Pra deixar a empresa como boazinha depois de degradar o meio ambiente? Pra gerir uma crise e continuar fazendo lucro pra empresa? Tudo bem, tudo bem...Eu sei que tem Marketing também. Mas eu não consigo ficar conformada com essa atuação depois de assistir ao documentário “The Corporation”. Você consegue? É conformismo mesmo ou só enxergar a realidade?
Concordo que há uns bons tempos a profissão vem tratando das grandes questões contemporâneas. Tem RP que se preocupa com os movimentos sociais, com as ONGs, com as políticas públicas, com o governo, com a participação da sociedade civil etc. E acredito que as coisas devam caminhar por aí mesmo.
Sem hipocrisia. Claro que dá pra trabalhar em empresas e boa sorte se sua vontade for essa! Mas tem tanta coisa ainda pela frente que dá pra ser resolvida por um RP com dialogicidade de verdade, ou será que eu estou criando uma ideologia da profissão?
Enfim...Dá pra alguém olhar pros verdadeiros problemas do mundo um pouco? Ou só pros do Brasil então? Que tal diagnosticar a realidade brasileira antes de se formar?
Chega de empresa, empresa e empresa...
E aí eu subo no pé de manga outra vez.
Thais Marin
Para saber mais, consulte o texto “O CONTEXTO HISTÓRICO DO NASCIMENTO DAS RELAÇÕES PÚBLICAS” de Júlio Afonso Pinho, no endereço: <http://www.jornalismo.ufsc.br/redealcar/cd3/rp/juliopinho.doc>.